por Laura Sequeira
Thomas Hobbes |
Quando pensamos
em construção estatal democrática, vem-nos à memória a obrigatoriedade de
todas as decisões serem tomadas para bem daqueles que por nós decidem e aos
quais cedemos a nossa liberdade de escolha, para que a nossa segurança seja
salvaguardada. Inconscientemente, acreditamos que a segurança vale mais do que
a liberdade, já que sem aquela, a própria liberdade seria impossível, dado que
o ser humano não conseguiria conviver em sociedade. Esta organização
estruturada em democracia só existe para que não voltemos a um patamar
hipotético onde tudo é mau – na verdade, é o pior possível – e onde o homem se
guia pela lei do mais forte, a única lei existente, para conseguir atingir o
que quer que seja, lutando com a sua vida.
O conceito de
liberdade é aquele de que cada um pode fazer o que lhe apetece, sem haver nada
que o castre. Ao fim ao cabo, a liberdade total concretiza-se na ausência de liberdade,
como facilmente entendemos. A esta descrição, Thomas Hobbes chama de estado de natureza. O estado hipotético
no qual o ser humano vive para se satisfazer a si próprio, utilizando a sua
força e fazendo primar o seu egoísmo e egocentrismo.
Como
sai o ser humano do estado de natureza? ‘Assinando’ um contrato onde há
precisamente a negação dessa liberdade, alienando os seus deveres e
transferindo-os para pessoa do Estado. Então, o Estado de Hobbes é aquele em é estabelecido um contrato entre as pessoas
para que se possa dar a harmonia entre as mesmas e assim serem criadas leis,
que informam o indivíduo dos seus interesses. Há uma entidade superior que sabe
o que é melhor para nós e por essa razão, como confiamos nela, delegamos
qualquer direito na mesma. Neste Estado, não há direitos inalienáveis, porque
nós somos o Estado.
Mas
não nos enganemos! A teoria de Hobbes ainda não contempla o direito de
revolução – a não ser que o Estado o declare, o que será difícil, como veremos.
Atentemos que foi escrito depois da entrada do Exército Invencível Espanhol em
Inglaterra, onde se vivia um clima de medo. O que é que era necessário? Alguém
Todo-Poderoso que personificasse o Estado, regendo o mesmo em prol do melhor
interesse de quem o constitui. A partir do momento em que cedemos os nossos
direitos, renegamos à liberdade de ação, mas a segurança é-nos garantida.
É
preciso frisar que o ser humano de Hobbes não é igual ao ser humano de
Aristóteles – neste último, somos propensos à organização em sociedade e a
negação da mesma leva-nos a ‘sair’ da nossa natureza. No caso de Hobbes, o que
acontece é que a nossa natureza é sermos individuais, mas para garantir a nossa
sobrevivência durante mais tempo, temos que nos organizar socialmente, já que a
vontade suprema de cada homem é a vontade de poder, que não se coaduna com a
vivência em sociedade. Assim, a passagem do estado de natureza para o estado
civil é um caso de vida ou de morte, literalmente.
É
certo que o indivíduo não se poderá conceber fora do Estado. Mas, como disse,
isto não é um acordo, porque este implica a opção de não o fazermos. Do que se
trata aqui é de um contrato – ou, para sermos simpáticos, de um acordo
necessário – em que o ser humano não tem outra opção. Não estamos a falar de um
consentimento ou de uma concórdia, mas sim de uma obrigação. O Homem só é livre
até ao momento em que é obrigado a fazer parte do Estado. A partir daí, já lhe
pertence, já é ele, com a ilusão de que é livre e tem direitos, quando na
verdade é a criação de leis por aquele em que ele, à partida, confia, que
determinam de que forma age. Do contrato, somos autores plenos. A partir daí,
de nada mais, já que temos que ter uma autorização para agir. A isto, chama
leis.
Uma das
questões que fica no ar, depois desta muito reduzida explicação acerca do estado
civil, é a seguinte: e se a lei for injusta? Ou, mais profundamente, e se eu pensar de forma diferente do estado?
Hobbes, de Calvin and Hobbes |
Talvez o
leitor, depois de esclarecido, consiga encontrar semelhanças entre este absurdo
Estado e o Estado onde se encontra.
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