Decretaram
a “morte das ideologias” - as
diferenças claras entre as opções políticas dos partidos, dos grupos ou dos
países teriam acabado com a queda do muro de Berlim (1989).
Esta é
mais uma das mistificações que a atual ofensiva ideológica do imperialismo dos
“mercados financeiros” usa para tornar inevitável o modelo único de capitalismo
mais desumano e mais cruel.
Depois da
2ª guerra mundial, levantou-se uma “cortina de ferro”, uma fronteira entre dois
sistemas antagónicos. No lado ocidental desenvolveu-se um sistema capitalista,
apoiado em governos com ideologia democrata-cristã e social-democrata, com
alternância no poder. No lado oriental consolidou-se o capitalismo de Estado,
apoiado na direção de um partido único que defendia uma política “rumo ao
socialismo e ao comunismo”.
O bloco
político e militar do lado oriental foi hegemonizado pela União Soviética, com
influência sobre a República Democrática Alemã (RDA), Polónia, Checoslováquia,
Hungria, Bulgária, Roménia e Albânia que formavam o pacto de Varsóvia. Com
algumas diferenças e independência, a Roménia e a Albânia e a Jugoslávia que
sempre se manteve fora deste pacto. Tinham em comum a centralização e a
planificação de todos os setores da sociedade. Garantiam as necessidades básicas
como o emprego e a reforma e asseguravam os cuidados de saúde, a educação, a
habitação, os transportes. Os rendimentos eram suficientes para a alimentação e
o vestuário. O desporto, a cultura, o ensino, a investigação científica, a
exploração espacial eram apoiados pelo Estado, como forma de afirmação da
superioridade do sistema.
Do lado
ocidental, apoiado no bloco militar da OTAN, implantou-se um sistema em que o
acesso aos bens de consumo e a proteção social, a liberdade de escolha,
concorriam com a situação controlada por um grupo dirigente do bloco de leste.
Eram exceção ao regime de liberdade as ditaduras na Grécia, Espanha e Portugal,
até 1974.
Este
sistema político pluralista, geria um capitalismo regulado pelo Estado e
aceitava a liberdade sindical, leis de trabalho progressivamente mais
favoráveis aos trabalhadores e a existência de imprensa e partidos defensores
do modelo soviético ou ainda mais heterodoxo como o seguido pelo Partido
Comunista da República Popular da China.
Em épocas
de crise, as cedências do sistema capitalista, confiaram nos partidos
socialistas ou social-democratas o controle das ambições dos trabalhadores.
Exemplo claro o apoio dos Estados Unidos ao Partido Socialista em Portugal,
quando a ditadura foi derrubada, como forma de travar a influência do Partido
Comunista e outros pequenos partidos de esquerda.
Entre a
maior abertura política do sistema soviético, ou a adoção do sistema da Europa
Ocidental, os países de Leste fizeram ruir o seu sistema, com a emblemática
queda do muro de Berlim.
No filme
do alemão Wolfgang Becker, “Goodbye Lenin”, ilustra-se bem a transição rápida
na RDA, onde entra a coca-cola e o mercedes, mas entra igualmente o desemprego,
a reforma compulsiva antecipada, o despedimento, o despejo da habitação, os
sem-abrigo. Como referiu Almeida Garrett no século XIX, os novos pobres foram a
consequência do aparecimento dos milionários a as chamadas “mafias do leste”.
O sistema
deixou de ter a necessidade de preservar uma aparente proteção do trabalhador, que
até desapareceu do vocabulário. Foram transformados em “colaboradores”, que não
são despedidos, apenas cessa o seu contrato de colaboração. A proteção social
recuou dezenas de anos e vai retirando garantias em nome da “sustentabilidade”
do sistema. Para que os lucros não diminuam, diminui-se o salário ou prescindem
dos “colaboradores”. O número de desempregados serve para “anestesiar” os
“candidatos a colaboradores” ou os que ainda mantêm o seu posto de trabalho,
com receio de não serem bafejados pela sorte de “colaborar” com os magnânimos
empreendedores.
O que
aconteceu nos últimos 22 anos foi o reforço do poder dos que decidem em nome
dos “mercados” financeiros, com a ameaça de “achinesar” as relações de
trabalho, com mais horas e mais anos de trabalho e com menos salário. A
produção foi “deslocalizada” para países ou regiões onde permanecem formas de
trabalho escravo.
Esta
situação não pode manter-se por muito tempo, porque nem morreram as ideologias, nem a História parou.
Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico.
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