Há dias uma amiga
confidenciava-me, com espanto, que uma mãe fora ralhar com a professora por
“não lhe admitir” propostas de trabalhos de casa para o seu filho porque,
estava a pagar “balúrdios” ao colégio e não estava disposta a perder parte do seu
tempo para o acompanhar nas tarefas escolares. Para além do mais, referiu ainda
ser uma pessoa muito ocupada com pouca disponibilidade para esse tipo de
coisas.
Situações como esta são mais
visíveis numa classe média alta, preocupada em dar o melhor aos seus filhos,
mas sem tempo “de qualidade” para eles.
Não colocamos em dúvida o
quanto estes pais se preocupam. Do que duvidamos é da “qualidade” dos afetos
nas relações entre pais e filhos e da importância que lhes é conferida, ou não,
na educação.
Em 2006, o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) de S. Paulo, Brasil, condenou um pai a pagar 200 mil reais à
filha por abandono afetivo. Uma decisão inédita que causou muita polémica e foi
altamente discutida nos órgãos de comunicação social.
Esta é já uma discussão acesa
no direito que tem gerado teses de mestrado e doutoramento.
Vanessa Viafore (advogada
no Rio Grande do Sul, Brasil), num artigo extraído do Trabalho de Conclusão de
Curso, em novembro de 2007 conclui que “O que se assiste na atualidade, é o necessário repensar dos direitos e deveres,
deixando de lado o autoritarismo, a patrimonialização, para atentar aos limites
do afeto, sustentando a função de esteio e alicerce da verdadeira família. A
responsabilidade civil surge no Direito de Família para justamente aperfeiçoar
os princípios fundamentais inerentes às relações familiares, com o compromisso
único de respeito à justiça, até mesmo por que esta compõe a única forma de o
Judiciário adentrar no âmbito familiar. O abuso de direito e o posterior abandono afetivo constituem atos
ilícitos passíveis de reparação na ordem moral. A condenação, ainda que seja
pelo desamor, uma vez que tenha causado prejuízo manifesto à dignidade do filho
rejeitado, mostra-se como melhor alternativa para compensar um dano ainda que manifestamente
moral.”
Em Portugal, na lei de proteção
de crianças e jovens em perigo (Lei nº 147/99), no seu artigo 3º, legitimidade
para a intervenção, considera-se que uma criança ou jovem está em perigo quando,
designadamente, entre outras situações, “não
recebe os cuidados ou a afeição
adequados à sua idade e situação pessoal" (alínea c, ponto 2) e “está sujeita, de forma direta ou indireta, a
comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional” (alínea e,
ponto 2).
A importância dos afetos no
desenvolvimento harmonioso de uma criança ou jovem, parece-nos evidente. Daniel
Sampaio, refere, no seu livro “Lavrar o mar”, 2006, que “quando se é pai de uma criança, é fundamental perceber…que a ligação
profunda com o filho é a base segura para que ele seja capaz de evoluir tanto
no plano cognitivo como no campo afetivo”.
Há um filme português, “Adeus
Pai”, que aborda este tema de uma forma magistral e que nos leva ao mundo de
uma criança de uma família de classe média alta que aparentemente tem tudo o
que precisa e no entanto falta-lhe algo precioso que o leva a fazer o luto de
um pai vivo.
“Adeus Pai” é um filme de 1996,
do realizador e argumentista Luís Filipe Rocha tendo como atores principais José Afonso Dias
Pimentel, no papel de filho e João Lagarto no papel de pai. O filme
aborda o tema de um filho espoliado dos afetos por parte do pai. Filipe tem 13
anos e, aparentemente, vive a concretização do seu maior sonho ao ir passar férias,
nos Açores, sozinho com o pai. Um filme, com a duração de 85m, que nos fala da
importância dos afetos no desenvolvimento integral do indivíduo.
Este
artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico.
Mais um excelente artigo da nossa querida Prof.ª Manuela Livro. Continue a nos presentear com estes artigos. Muitos parabéns...aguardo o próximo.
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