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quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Marijuana e Outras Drogas (ou: Uma Penitenciária por Uma Pedrada)


por Lostio

Ai, marijuana, o ingrediente fulcral da música reggae, a fonte de inspiração responsável por muitas das mais grandiosas obras artísticas da atualidade... e um elemento cuja utilização é punível por lei.
Desde há muito tempo que o uso de drogas cria infelizes associações mentais, impingidas por filmes como Requiem for a Dream e outras publicidades manipuladoras, de que esta trará necessariamente histórias mórbidas de dependência, desperdício de vida, gastos dispendiosos…

No que toca à legislação relativa a drogas, a minha posição está muito centrada no respeito que eu exijo por parte do Governo, e pode ser definida como: “Eu não creio que o Governo está no direito de controlar aquilo que eu decido fazer com o meu corpo”. Deste modo, a meu ver, a posse e uso de drogas não são algo que deva constituir um crime. Isto porque, ao utilizar drogas, não se está a retirar liberdades a ninguém, não se está a retirar qualidade de vida ou a prejudicar qualquer pessoa a não ser nós próprios.
Note-se que esta ideologia, dada a sua natureza, é aplicável a qualquer tipo de droga. Eu devo poder escolher o que faço comigo próprio sem represálias, pois as consequências dos meus actos apenas influenciarão a mim, no que toca à posse e uso de drogas.

Naturalmente, o receio principal que vem com a legalização das drogas está no perigo para a saúde e na dependência física criada por estas. Para começar, independentemente do mal que constituem, creio que a decisão final quanto ao seu uso deverá estar no indivíduo. Não é o papel do Governo tratar cidadãos como bebés, proibindo-os de ter o seu doce porque faz mal.
O que se deverá fazer (que é o que se faz com as drogas atualmente legais, tabaco e álcool), é apostar na consciencialização da população para os perigos presentes, e nas leis de controlo no que toca à comercialização, venda e distribuição. Visto que a decisão de consumir drogas requer uma definitiva maturidade mental, requisitos tais como a idade mínima e a garantia de que o indivíduo não exibe dependência física, ou outro tipo de comportamento associado ao uso indevido da droga (p. ex., embriaguez) são protocolos mais que necessários, mas não implicam, nem o devem, uma completa ilegalização do uso de drogas.

Há que quebrar também alguns preconceitos típicos. Pelo menos no que toca a drogas como canábis e ecstasy, o seu efeito diretamente prejudicial à saúde não é tão significativo como o de substâncias atualmente legais e utilizadas em massa como o tabaco e o álcool, tal como um estudo publicado no periódico The Lancet demonstra. Assim, a proibição legal das drogas leves com base em argumentos de saúde torna-se logicamente inconsistente. 



Uma outra incoerência associada à justificação baseada na saúde é a existência de muitas destas drogas terem fins medicinais. A existência de marijuana medicinal não é um conceito novo nem raro, e é uma prescrição totalmente válida para ajudar vários pacientes a ultrapassar efeitos de quimioterapia tais como náuseas, insónias, falta de apetite, etc.

 Substâncias como canábis e outras drogas têm de deixar de ser vistas como um símbolo incontornável de algo que apenas trará males. A legislação não tem de as apoiar, não creio que se deva influenciar os cidadãos para uma vertente de seguir uma vida em que as utilizem frequentemente. Mas a atitude de proibição, de punir o mero uso recreativo destas drogas, é algo que não creio ser o papel do Governo, até porque é inconsistente com o facto de cigarros e bebidas alcoólicas serem perfeitamente legais e válidas.


8 comentários:

  1. Gostei do texto e, no geral, estou de acordo. No entanto é preciso ter em conta que a dependência de certas drogas pode levar à prática de outros crimes mais graves (como roubos ou assassínios). Claro que essas são mais pesadas que as referidas no texto. O álcool também leva muitas vezes a que ocorram certos incidentes puníveis por lei (acidentes de viação), mas não costumam ser provocados pela dependência.
    Se não for para incomodar nada nem ninguém penso que cabe a cada um decidir se quer consumir ou não. Sublinho: se não for para incomodar nada nem ninguém.
    A não proibição não quer dizer todos o façam.

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    1. Nem mais, Miguel, focaste precisamente os aspetos que pretendia reforçar no meu texto. :)

      Sim, é verdade que o consumo exagerado de algumas drogas e a dependência a estas pode levar à prática de atos mais condenáveis e mesmo criminosos. De qualquer modo, não creio que tal seja uma razão para impedir o uso recreativo das drogas, porque nem todos os casos de consumo de drogas levam necessariamente a esse fim, e estaríamos a prejudicar quem consegue consumir estas drogas de um modo maduro e seguro apenas para evitar alguns casos específicos mais extremistas. Se realmente o consumo dependente chegar a tal fim, temos todas as capacidades para agir em bem do toxicodependente, e evitar que ele se prejudique e aos outros ainda mais.

      Até porque, tal como disseste, algumas drogas atualmente legais já levam a comportamentos e fins criminosos. Quantos casos não se conhecem de pessoas embriagadas que acabam por perturbar a paz social por agirem de modo violento e agressivo, ou histórias de violência doméstica causadas por maridos alcoólatras.

      Tal como disseste, "se não for para incomodar nada nem ninguém", quem somos nós para impor uma proibição tão baseada em estereótipos e preconceitos sobre o consumo de drogas?

      Muito obrigado pelo comentário, Miguel, espero ver mais deles cá pelo blog! ;)

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  2. Concordo em geral com o que dizes e com o que o Miguel disse.
    Acho que o problema é a moderação.
    Nos pacotinhos de tabaco estão afixados vários avisos: diminuem o tempo de vida, levam a tumores, podem induzir doenças nos fumadores passivos, etc etc, coisas que todos nós já conhecemos.
    Nas garrafas de bebidas alcoólicas temos os mesmos avisos: Beba com moderação.
    Isto não significa que um fumador vá fumar menos só porque no aviso diz que o facto de fumar o pode matar, nem um alcoólico vai beber menos só porque pode desenvolver uma cirrose no fígado.
    Portanto concordo que algumas drogas deveriam ser legais, assim como o são o álcool, o tabaco e a marijuana medicinal(nalguns locais). É claro que drogas que são conhecidas por terem um efeito altamente viciante como a heroína e a cocaína tenho as minhas reticências quanto a torná-las legais, existem certas coisas que simplesmente era melhor não terem sido descobertas/criadas.
    No fim, penso que a melhor politica é a da moderação, algo que não posso deixar de frisar. Penso que fumar um "charro" de vez em quando não ia matar ninguém. Não leva necessariamente há dependência e ao crime.

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    1. Antes de mais, Lilrien, o meu agradecimento pessoal pelo comentário! :)

      Agora, devo dizer que, apesar de compreender o teu ponto de vista e este ter a minha empatia, queria só reforçar alguns aspetos essenciais.

      Uma coisa é aquilo que o Governo e a legislação consegue permitir, outra coisa é aquilo que os indivíduos decidem fazer por si. Nós não podemos forçar cada um a consumir droga de um modo maturo e consciente, o máximo que podemos fazer é espalhar a informação quanto aos perigos das drogas, e apostar precisamente em divulgar estes avisos.

      Ora, naturalmente que a melhor atitude seria a de moderação, mas, tal como disseste, não é por dizermos nos pacotes de tabaco que fumar mata, pode levar ao cancro, etc. ou por aconselharmos vivamente que as bebidas alcoólicas sejam consumidas com moderação que os cidadãos irão obedecer.

      No entanto, a responsabilidade nestes aspetos é, e deverá ser, das pessoas. O Governo não tem, a meu ver, qualquer direito em proibir estes estilos de vida, se as pessoas o decidirem seguir. A melhor atitude governamental é a de permissão com um aviso, e não a de punição.

      Portanto, no que toca ao consumo individual de drogas, mesmo as pesadas como a heroína ou a cocaína, continuo a não compreender a lógica por detrás da punição. Compreendo e sou totalmente a favor de uma ideologia em que este estilo de vida NÃO seja apoiado, e que não haja influências quaisquer em persuadir as pessoas em realmente consumirem estas drogas, até pelo contrário. Mas não vamos punir as pessoas por se estarem a matar, essencialmente por duas razões: uma, porque quem deve decidir se se quer matar ou se meter numa vida de dependência é puramente delas; segunda, porque, ao fazê-lo, não estão a incomodar mais ninguém nem estão a perturbar de qualquer modo o ambiente social ou político. É uma decisão condenável, sim. Mas puni-la por lei parece-me um pouco bater no ceguinho, tal como o meme que coloquei no artigo evidencia.

      Sou a favor também que se disponibilize centros de apoio e reabilitação às pessoas que efetivamente se deixaram meter demasiado a fundo, e pretendem sair dela. No entanto, castigar quem se decide drogar é uma atitude inadequadamente paternalista e condescendente, é uma arrogância por parte do Governo em dizer que estilo de vida cada um decide tomar, daí a minha maior abertura no que toca à legalização das drogas.

      Especificamente, no que toca às drogas leves como a marijuana, então, quaisquer argumentos, mesmo os baseados na preocupação com a saúde das pessoas, a meu ver, colapsam completamente face à legalização do tabaco e do álcool.

      A política de moderação tem todo o meu apoio, mas a questão é que não é algo que podemos controlar, de um ponto de vista político, apenas recomendar, como já é o caso.

      Mais uma vez, muito obrigado pela tua contribuição para a discussão, espero que seja algo recorrente! ;)

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  3. E atenção que ninguém morre por fumar marijuana, ao contrário de outras drogas mais pesadas ou dos efeitos do próprio álcool, por exemplo. Ainda há muita gente que põe as drogas todas no mesmo saco classificando-as como iguais, e não é bem assim. Quem consome marijuana não quer dizer que dê na heroína e cocaína que são altamente viciantes, aliás fumar marijuana não é a 100% um preditor para o consumo de drogas mais pesadas. Contudo saliento a importância do limite da idade, como referiste. O consumo precoce tem consequências drásticas, mas isso também o álcool nas fases mais intensas de desenvolvimento físico e psicológico. Em género de conclusão deixo aqui um vídeo que, embora a gozar com a situação, diz muitas verdades :)
    http://www.youtube.com/watch?v=qwchkrNGCYI

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    1. Olá, Sofia, gosto de te ver por aqui! :)

      Salientaste precisamente a deplorável estereotipagem que ocorre no que toca às discussões sobre drogas. Tal como dizes, há muita tendência em "colocar todas as drogas no mesmo saco", sem que ninguém se preocupe realmente em investigar as suas características, os efeitos e outros pormenores relevantes que distinguem cada uma delas (e que distinguem bem).

      Existe imensa manipulação por parte dos media, por publicidades, toda nitidamente influenciáveis e de visão limitada. Tudo o que disseste sobre os aspetos mais inofensivos da marijuana (não causa overdose, não mata) é agora, felizmente, informação mais espalhada e acessível. No entanto, os preconceitos de que esta levará inevitavelmente às drogas pesadas são ainda muito frequentes, razão pela qual a sua ilegalização ainda é uma prática muito comum.

      Continuo a considerar o controlo sobre a quem se disponibiliza a droga um assunto sério e em que se devia investir, especialmente no que toca às drogas que causam maior dependência. Limites de idade, a confirmação de que a pessoa reúne as condições de saúde mental e física para decidir consumir a droga são regulamentos que definitivamente acho importantes.

      Ah, e adorei o vídeo, obrigado por o postares. xD Este acaba por ser um tema predileto de vários comediantes stand-up, a abordagem de Bill Hicks também é uma que gosto muito: http://www.youtube.com/watch?v=qZqYV9KKOZQ

      Muito obrigado pelo comentário, espero encontrar mais deles por cá! ;)

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  4. Depois de um longo comentário que foi para o lixo, um mais pequeno - o proibicionismo é uma hipocrisia que só amplia o problema, não o resolve.

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    1. Caro Luís, por mais extenso que o seu comentário anterior pudesse ter sido, penso que condensou de um modo perfeito a mensagem principal. Concordo plenamente, e não poderia tê-lo dito melhor! :)

      Muito obrigado pelo comentário!

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