por Laura Sequeira
Antes da leitura deste texto, peço que o leitor se abstraia das suas crenças enquanto ser ocidental – ou criado numa sociedade ocidentalizada – e que a crítica não seja durante o ato da leitura, senão após o mesmo.
Antes da leitura deste texto, peço que o leitor se abstraia das suas crenças enquanto ser ocidental – ou criado numa sociedade ocidentalizada – e que a crítica não seja durante o ato da leitura, senão após o mesmo.
Os meus olhos são uns
olhos,
e é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos,
onde outros, com outros olhos,
não vêem escolhos nenhuns.
António Gedeão
O ser humano ocidental tem a incrível
capacidade e certeza de que se pode reconhecer no presente, lembrar do passado e
de conseguir projetar no futuro. Podemos por isso dizer que é um ser do tempo,
um ser temporal, o que não significa que tenha que ser autocentrado – que é uma
característica do mesmo. Isto determina o tipo de pensamento que se desenvolve
e que está presente na mais pequena decisão que tomamos. A partir do momento em
que a supremacia da razão do próprio é o plano central responsável por qualquer
decisão, estamos perante uma sociedade jovem, adolescente, que se pretende
autoafirmar de uma forma rebelde. Toda a construção à volta do ‘eu’ (i.e.
penso, logo existo) é sinónimo do pouco que nos pomos ‘aos ombros de gigantes’,
julgando-nos nós mesmos tais criaturas.
Mas nem sempre tem sido assim.
Se nos reportarmos à sociedade Oriental e
à sua Filosofia, que frequentemente se mistura com a Religião, concluímos que a
Ocidentalidade que nos caracteriza está substancialmente desadequada aos
objectivos que para nós estabelecemos e pretendemos cumprir. O problema atual,
seja de que ramo for, está presente nos alicerces, nas origens. É preciso que
as reconheçamos e que toleremos que a aprendizagem possa vir de outros que como
nós não são. Daqui, pode advir uma de duas coisas: ou nasce um fascínio pelo
Oriente e a nossa perspectiva muda radicalmente, porquanto somos capazes de
reconhecer a nossa adolescência, ou, por outro lado, continuamos com a nossa
postura gigantesca, sem nos apercebermos que estamos a ver por entre as pernas
Orientais. O Homem Ocidental, ao contrário do Oriental, não pensa para além do
que é fenómeno. Quer-se dizer, do que é materializável, do que se apresenta, do
que aparece. Por consequência, não pensa nas origens de cada ente, o que torna
imediata a falsa sensação de posse do que há. Se continuarmos a nossa análise
comparativa, damo-nos conta de que o Homem Oriental não pensa desta forma. Este
não deixa de criar civilizações – por exemplo, a riquíssima civilização Indiana
nasceu entre os anos 2000 e 1000 a.C – mas a noção de temporalidade e de ‘eu’ é
muito distinta.
Conceptualmente, o ‘eu’ não é um dado
adquirido. Enquanto há uma auto-evidência do ‘eu’ por parte Ocidental, o
Oriental pretende a sua desconstrução
em vez da obrigatória construção do ser, tão essencial para nós. Isto acontece
porque há a crença da ilusão de uma subjetividade, onde o raciocínio cartesiano
não está presente, e da qual aspiram libertar-se. É daqui que surge o tão
conhecido conceito de ‘libertação’, por vezes mal interpretado. Esta é a
libertação do samsara, quer-se dizer, dos nascimentos consecutivos através dos
tempos, para o retorno ao lugar de onde se veio – conceptualmente, Brahman.
Quando o homem reconhece que pertence ao todo, quando se lembra que, embora
tenha passado por uma fase de esquecimento, pode agora voltar a unir-se ao
princípio comum a todas as coisas – não só as que aparecem, os fenómenos, mas
aquelas que estão ocultas –, então está pronto para se libertar da rede de
nascimentos. E assim, está livre. Em vida, pode buscar-se e encontrar-se e esta
ideia é o máximo a que alguém pode aspirar. Daqui surge a anteriormente
referida ideia de desconstrução do ‘eu’. Ora, como o ‘eu’ para o Oriental está
em tudo, então chega-se à conclusão de que o mesmo descobre o alicerce de tudo
o que se mostra.
Independentemente de termos sido
construídos da forma que somos e de haver a possibilidade de não acreditarmos
que voltamos para onde viemos, a ideia importante a retirar daqui é a seguinte:
a certeza do ser não é explorada, porque é adquirida. Quando se pensa, não se
pode pensar sobre nada. De uma forma incrível, conseguimos entrar,
recentemente, num estado de latência e de estupidificação tal, que o problema
da essência – ou do ‘alicerce’ – já nem se coloca porque há demasiada distração
fenoménica que afoga o pensamento. A noção de evolução e de progresso é a
construção incessante de tijolos sobre a consciência e a interrogação de si.
Apelo à visão compreensiva e interpretativa, já que o nosso olhar que outrora
fora de acesso ao mundo e interrogativo, é agora objectivo e cientista, em todo
o seu esplendor negativo.
Hegel's lectures on the History of Philosophy
Institute of Oriental Philosophy
Página oficial do professor Paulo Borges, professor de Filosofias na Ásia, a quem agradeço as aulas que inspiraram este texto.
Mafalda Blanc, professora de Metafísica, idem
Hegel's lectures on the History of Philosophy
Institute of Oriental Philosophy
Página oficial do professor Paulo Borges, professor de Filosofias na Ásia, a quem agradeço as aulas que inspiraram este texto.
Mafalda Blanc, professora de Metafísica, idem
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