Blogue de divulgação cultural, escrito por 28 pessoas. Um texto por dia, todos os dias.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Memória - Welcome to the dark side

por Ana Melo Faustino



Memória, uma das grandes capacidades conhecidas do cérebro humano, instigadora de curiosidade, desde há vários séculos, não só a cientistas, mas também a filósofos e à própria sociedade.

Atualmente, sabe-se que a memória resulta de uma complexa comunicação neuronal entre diversas estruturas, tais como o hipocampo, o gyrus parahipocampal, os cortéx pré-frontal, pré-cúneo, cingular, temporal, entre muitos outros, e, ainda, a amígdala. Esta é uma estrutura altamente importante para o comportamento social, bem como para o processo de auto-referenciamento, desempenhando, por isso, um papel crucial no tema que vos trago para esta semana – a hipertimesia ou hiperamnésia autobiográfica.

A hipertimesia traduz-se  por uma condição clínica na qual o indivíduo possui uma memória autobiográfica superior, isto é, consegue recordar um grande leque de experiências e eventos vividos anteriormente, sendo-lhe possível relatar com bastante detalhe quase todos os dias da sua vida.


Em 2006, na revista Neurocase, foi documentado o primeiro caso de hipertimesia, o da americana AJ (Jill Price). Atualmente, conhecem-se cerca de 20 casos em todo o planeta, mas a verdadeira etiologia desta patologia permanece pouco conhecida.


No entanto, os estudos científicos efectuados demonstraram que, apesar de uma memória autobiográfica superior ao normal, há uma certa dificuldade no que toca a memorizar pequenas coisas do dia-a-dia; por exemplo, AJ que declarou usar 5 chaves diferentes no porta-chaves e, no entanto, nunca sabe a onde pertencem. Outro exemplo seria o de Aurelien Hayman, um jovem de 20 anos, que afirma não ter qualquer vantagem face ao seu curso universitário devido à sua condição.
Os cientistas afirmam haver uma compensação , verificando-se um deficit em funções de organização e controle mental, podendo inclusive haver  tendências obsessivo-compulsivas.


Ora bem, quem não odeia esquecer-se do aniversário de um amigo, a password da conta, aquele recado que era importante? Pois bem, eu cá acho que o esquecimento é subestimado na sociedade e, no entanto, chegamos a esquecer o próprio esquecimento.

Mas como será viver sem conseguir esquecer aquele dia horrível? Aquela vergonha que passamos em frente a alguém que queríamos surpreender? Aquela discussão que nos desfez em mil pedaços? A morte daquele familiar/amigo tão querido? Aquele acidente traumático? Aquele medo de infância?
O ramo da psicologia estuda um processo mental conhecido pelo nome de Recalcamento que, muito resumidamente, consiste numa forma de armazenar a informação que nos é “dolorosa”, uma informação que precisa/deve ser “esquecida”, que nos influencia, sim, mas que não está “ativamente” presente no dia-a-dia, contrariamente, por exemplo, à noção de “quem sou eu”.  Mas, e se não existisse este processo, e se fossemos obrigados a recordar cada passo que demos ao longo de 10, 20, 30 anos...?
É o que acontece aos indivíduos com hipertimesia, acabam por ser “forçados” a lembrar-se da roupa que vestiam, o que comeram ou que músicas ouviram na rádio no dia X ou Y, mesmo que tenha sido há 25 anos atrás. Muitos afirmam que simplesmente lhes vem à memória, por vezes, revivem-na numa espécie de filme, outras nem dá tempo para isso... simplesmente se lembram, sem qualquer esforço.

E agora, ainda excomunga o esquecimento?

Documentário (inglês):  
















Consulta:
A case of hyperthymesia: rethinking the role of the amygdala in autobiographical memory

Sem comentários:

Enviar um comentário